“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

A Supremacia Papal - II

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Cardeal Pietro Gaspari, secretário de Estado do papa Pio XI, e o Duce Benito Mussolini assinam o Tratado de Latrão (fevereiro de 1929). 

O século XVIII foi rico em acontecimentos políticos, culturais e econômicos. Pode-se dizer que, nessa época, a secularização da Europa ocidental atingiu o clímax. Concorreu para isso, em primeiro lugar, o Iluminismo, movimento intelectual burguês que buscou estabelecer o primado da razão. Filósofos anticlericais como Voltaire (1694-1798) tornaram-se extremamente populares e influenciaram intelectuais, políticos e revolucionários. 

Outro acontecimento marcante desse século foi a Revolução Industrial, que teve a Inglaterra como nação pioneira. A partir da década de 1760, uma série de invenções provocaram a transição da manufatura para a maquinofatura. Surgia, assim, a fábrica moderna. Apesar dos inúmeros benefícios advindos da maior oferta de bens acabados, as extensas jornadas de trabalho combinadas com a ausência de leis trabalhistas deram grande impulso ao processo de descristianização da Europa, como explica P. Deane no livro A Revolução Industrial.

Contudo, o golpe mais duro à supremacia papal foi desferido pela Revolução Francesa (1789-1799), a primeira revolução burguesa inspirada pelos iluministas. No dia 2 de novembro de 1789, os bens do clero foram postos "à disposição da nação" e depois leiloados. Em fevereiro de 1790, o clero regular foi extinto. Ainda nesse ano, no dia 12 de julho (a dois dias da comemoração do primeiro aniversário da Revolução), a Assembleia Nacional aprovou a Constituição Civil do Clero. Ficou determinado que os bispos e os curas seriam eleitos como os demais funcionários públicos. "Os novos eleitos seriam instituídos por seus superiores eclesiásticos, os bispos por seus metropolitanos e não mais pelo papa. A Igreja da França tornava-se uma Igreja nacional" (Soboul, 1979: p. 51). Contudo, embora sem jurisdição, o papa conservava a primazia espiritual sobre a Igreja francesa, e o clero do país dividiu-se entre aqueles que prestaram juramento à Constituição do reino (o que incluía a Constituição civil que se lhe incorporava) e os refratários a tal juramento (Soboul, 1979: p. 52). 

Entretanto, a situação do clero ainda iria piorar muito na França. Com o reinado do Terror, entre agosto de 1792 e julho de 1794, muitos padres foram guilhotinados e procedeu-se à descristianização da França. O culto cívico da Razão procurou substituir a religião revelada, e Bíblias foram destruídas. A escritora Ellen G. White fez um resumo desse período: "O poder ateísta que governou na França durante a Revolução e o reinado do Terror, desencadeou contra Deus e Sua santa Palavra uma guerra como jamais o testemunhara o mundo. O culto à Divindade fora abolido pela Assembleia Nacional. Bíblia eram recolhidas e publicamente queimadas com toda a manifestação de escárnio possível. A lei de Deus era calcada a pés" (O Grande Conflito, p. 273). Após o Terror, entre 1795 e 1799 a política do Diretório oscilou entre a perseguição e a permissão para que os cristãos praticassem a sua religião. 

Seguindo a tendência de afastamento da religião, o governo de Napoleão Bonaparte iniciou-se com relações tensas com Roma. Em 1798, Berthier, um de seus generais, marchou até o Vaticano e aprisionou o papa Pio VI, que faleceu no ano seguinte. Isso ocorreu porque o pontífice não aceitou renunciar aos seus poderes temporais. Vários comentaristas bíblicos enxergam nesse episódio a ferida mortal que foi desferida à Besta, conforme consta em Apocalipse 13, 3. O início da cura, no entanto, não demorou: Napoleão e o papa Pio VII firmaram a Concordata, em 1801. 

Contudo, a "cura" propriamente dita se iniciou em 1929, quando representantes do Estado fascista na Itália firmaram com a Santa Sé o Tratado de Latrão. Encerrava-se assim a "Questão Romana", e o Vaticano passava a ser um Estado soberano. Desde então o papado vem ganhando força, embora tenha tido um papel ínfimo durante a Guerra Fria (dizem que Stalin, tirano soviético, questionava quantas divisões o papa possuía...). Com o colapso do Socialismo Real no Leste Europeu e a desintegração da União Soviética, o papado voltou a ganhar força, na figura do carismático João Paulo II (sobre isso, os livros a serem lidos são O Grande Conflito, de Ellen G. White, e O Dia do Dragão, de Clifford Goldstein). Ora, João Paulo II foi canonizado pelo papa Francisco, outro pontífice carismático que tem dado passos largos rumo ao ecumenismo. 

"Toda a Terra" tem se maravilhado ante à imagem do bispo de Roma.


* Leia a 1ª parte deste artigo AQUI.

* Conheça os Papas do Mal.

Bibliografia consultada:
DEANE, P. A Revolução Industrial. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 1969.
GILBERT, M. História do Século XX. Lisboa: Dom Quixote, 2014.
GOLDSTEIN, Clifford. O Dia do Dragão. Tatuí, São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 1997.
SOBOUL, A. História da Revolução Francesa. São Paulo: DIFEL, 1979.
WHITE, E. G. O Grande Conflito. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira [1ª edição: 1858]. 

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